“Quando eu falo a palavra ʽarteʼ, o que vem à sua cabeça?”, questiona a pesquisadora e curadora Keyna Eleison, nos primeiros minutos da edição de novembro do curso Transversalidades, dentro do Programa CCBB Educativo – Arte & Educação. As respostas do público, formado por professores e professoras, educadores e educadoras, são diversas: Frida Kahlo, Tarsila do Amaral e Jaime Lauriano, entre muitos outros nomes. “É curioso porque, quando a gente fala de arte, estamos falando de nós mesmos, construindo relações com nossas referências e bagagens. Para mim, a arte é uma área do conhecimento que pode abarcar todos os outros campos, sejam eles de humanas, exatas ou biológicas. E, da mesma forma, eles podem estar inseridos nela.”

Também filósofa e mestre em História da Arte, Keyna aplica essa perspectiva em seu trabalho como curadora, nominação da qual não abre mão, mesmo atuando em outras funções. No currículo, acumula as exposições “Sob a Potência da Presença”, no Museu da República, “Fluxo do desvio”, no Centro Cultural Hélio Oiticica, e “Manjar”, no Solar dos Abacaxis, entre outras. 

“Muita gente me pergunta o que é ser curadora. Gosto de responder a essa pergunta partindo da negação: não é ser artista, ou dona da galeria, tampouco do centro cultural ou ter a propriedade das obras. O que faz, então, a curadoria? Se não faz o trabalho, não abriga as obras, não detém a propriedade delas, onde ela pode estar? Ser curadora é elaborar linhas de pensamentos, conexões e/ou ligações que preencham as brechas entre as variadas outras funções que permeiam a realização de uma exposição de arte”, sintetiza a pesquisadora.

Em sua visão, esses pensamentos – no plural – seguem uma lógica complexa de constante reflexão, apresentada como contraste à ideia de utopia – lugar imaginário, ideal. Keyna Eleison ressalta trabalhar de acordo com questionamentos suscitados ao longo de todo o processo de montagem de cada exposição, e considera que a abertura, momento final em que o público entra nas galerias e desfruta da experiência estética ali posta, não é, necessariamente, o arremate, mas a continuidade de seu processo criativo como curadora. 

“Como alguém que tem uma relação fortemente atrelada às dúvidas e questões, meu objetivo é usar isso como um campo de poder e conhecimento. Alia-se a isso o fato de que eu sempre tive vontade de trabalhar no campo da arte, mas eu não sou artista. O que eu deveria fazer? A saída encontrada foi desenvolver pensamentos que tenham a capacidade de promover algum tipo de mudança”, afirma.

Pensamentos no espaço

Keyna nos lembra ainda que o trabalho de curadoria envolve uma série de processos que vão desde a pesquisa e o acompanhamento de processos até a disposição das obras no espaço expositivo. Embora sejam atividades muitas vezes desenvolvidas em parceria com os e as artistas, o corpo curatorial é quem geralmente toma decisões em relação à expografia dos trabalhos. “Isso também pode acontecer com os programas educativos, que mediam as visitas às mostras. Quando o trabalho de arte está pronto e é exposto, ele é do público. O educativo e a curadoria, portanto, também habitam esse espaço”, conclui.

A convidada explica, por fim, a um público formado principalmente por profissionais da educação, que uma aula, uma prova, um processo educativo ou uma atividade dada em sala de aula também podem ser vistos como arte. Dessa forma, professores e professoras, assim como educadores e educadoras, passam a ter o status de curadores e curadoras, na medida em que estão elaborando pensamentos e colocando-os em prática para impactar a vida de um público específico.

“Quando vocês ocupam esse lugar, têm a oportunidade de trabalhar com a superfície dos alunos, ou seja, com aquilo que está mais próximo do cotidiano deles, da realidade em que eles estão inseridos, da cultura que eles estão acostumados em consumir. É claro que a escola também desempenha o papel de construir referências, mas é muito mais produtivo quando a gente parte de um lugar de reconhecimento e representatividade”, analisa, ressaltando a importância de processos que se transformam a partir de diálogos travados ao longo do caminho.