Na adolescência, quando morava em São Gonçalo, José Leandro Cardoso esteve no CCBB RJ em uma de suas primeiras idas à capital do estado do Rio de Janeiro. Como colecionador de moedas, ele se encantou pela “Galeria de Valores”; como cinéfilo, passou a frequentar as exibições de filmes que aconteciam no centro cultural. Muito embora tenha se formado historiador, nunca deixou de se interessar pela sétima arte e, aos poucos, em seu trabalho na rede municipal de ensino, conseguiu aplicar a linguagem audiovisual como estratégia de aprendizagem para os alunos.

“Quando comecei a trabalhar com cinema nas escolas, parti da premissa de que, quando eu era adolescente, assistir a determinados filmes foi de extrema importância para ampliar o meu conhecimento de mundo. Então, o meu maior objetivo com a aplicação do audiovisual nas escolas é fazer com que os alunos construam um repertório e adquiram a curiosidade de buscar outros filmes para assistir”, explica o educador, ao conduzir mais uma edição do curso Transversalidades, dentro do Programa CCBB Educativo – Arte & Educação.

Ministrado no contexto da exposição “DreamWorks Animation – A Exposição: Uma Jornada do Esboço à Tela”, então em cartaz no CCBB RJ, o curso abordou o cinema como um instrumento educacional que pode ser compreendido tanto no ato de assistir a um filme e posteriormente discuti-lo, quanto no trabalho de construir um produto audiovisual – processo que envolve pesquisa, desenvolvimento, produção e pós-produção, entre outras etapas.

“Como professor de história, entendo que esta é uma das disciplinas – senão a única – que formalizou o uso do cinema nas escolas. Muitas vezes, os filmes são utilizados para ilustrar algum acontecimento, mostrar como eram os costumes de determinada época ou fazer os alunos compreenderem uma passagem histórica. O que estou defendendo aqui é uma visão ampliada do uso do cinema na educação como estratégia para integrar os estudantes e se tornar um instrumento de trabalho para outras disciplinas”, defende.

Cineclube nas escolas

De acordo com o professor, a educação brasileira experimentou o uso do cinema nas escolas a partir de 1936, com a criação do Instituto Nacional do Cinema Educativo (INCE), cujo objetivo era promover e orientar a utilização do cinema como auxiliar do ensino voltado para a educação popular. Ao longo da existência do Instituto, extinto em 1966, foram registrados mais de 400 filmes, entre curtas e médias. A partir daí, popularizaram-se os Cineclubes que, com o endurecimento da Ditadura Civil-Militar (1964-1985), foram desaparecendo.

Desenvolvido algumas décadas depois, já em 2008, pela Gerência de Mídia e Educação da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, o projeto Cineclube nas Escolas retomou a proposta de desconstruir a ideia de que a exibição de filmes nas escolas deve se limitar ao entretenimento ou à apresentação de determinados conteúdos. Como articulador da iniciativa, José Leandro Cardoso atua justamente fomentando atividades de visionamento, análise fílmica e produção audiovisual nas escolas.

“Ao longo do desenvolvimento do projeto, percebemos que a mera exibição dos filmes não seria o bastante para os alunos. Então, a partir das discussões em torno dos filmes, das análises desenvolvidas nas sessões, percebemos o ímpeto deles de partir para a produção fílmica em si”, conta.

Câmera nas mãos

Um dos experimentos compartilhados durante o curso foi o curta “Se estou suja é porque não tenho sabão”, realizado pelos estudantes da disciplina eletiva “Luz, Câmera e Educação”, do Ginásio Experimental Carioca Nilo Peçanha. Desenvolvido em ocasião do centenário da escritora Maria Carolina de Jesus (1914-1977), o filme traz uma pesquisa feita pelos estudantes para contar a história da escritora.

“Esse foi um trabalho muito importante, não só por tratar da história de uma pessoa praticamente esquecida, mas também como experiência para mim, como educador, para a escola e para os alunos. Esse curta rodou em alguns festivais, e isso faz com que os alunos ocupem esses espaços, se façam presentes e participem das discussões”, analisa.

José Leandro também destaca a natureza interdisciplinar do trabalho, que acaba envolvendo diferentes áreas do conhecimento para contar histórias por meio do audiovisual. Desenvolvido pelos estudantes da Escola Municipal Benjamin Constant, o curta “Benjamin e sua História” foi apresentado como exemplo de um trabalho de pesquisa envolveu o professores de diferentes disciplinas, bem como idas a exposições.

“Esse filme, que na verdade é uma animação, foi feito para o edital de Produção Autônoma do Animamundi. Para além de envolver os alunos em uma produção horizontalizada, de um produto a que eles se sentem pertencentes, a experiência fez com que eles conhecessem outros tipos de espaços onde é possível estar, como o próprio festival”, assinala.