As expressões das pessoas adultas quando vêem um bebê dentro de uma exposição de arte são certamente muito diversas. Costumam transitar do encantamento à surpresa, incluindo alguns responsáveis desesperados com seus pequenos, correndo de um lado para o outro, e mães apreciando as obras enquanto amamentam. Essas são somente algumas das visões que tivemos no CCBB RJ durante os dias em que realizamos atividades para bebês. Trata-se de momentos de socialização e fruição com a arte que, para a maioria dos responsáveis por crianças pequenas, são instantes raros que há muito não acontecem.

O desejo de intensificar o diálogo com as crianças pequenas – e seus responsáveis – é algo que nos move dentro do Grupo de Trabalho Infâncias (GT Infâncias), um dos eixos integrantes do Programa CCBB Educativo – Arte e Educação. Para dar continuidade à pesquisa e o trabalho iniciados em 2018 com “Basquiat para bebês”, em parceria com Maria Emília Tagliari, propusemos no mês de outubro de 2019 a terceira edição da Atividade para Bebês. Dessa vez, entramos em contato com a exposição “Ai Weiwei – Raiz”.

Olhares atentos, corpos que se movem de modo a esquecer, por um longo e prazeroso tempo, as normas sociais que tanto restringem nossos movimentos. Dentro da sala do setor educativo, também chamada de “laboratório”, construímos um espaço dedicado a acolher bebês e acompanhantes, de modo que somente o momento presente pudesse existir a todo instante, deixando fora da sala outras preocupações. De um lado, o olhar cuidadoso e alerta das mediadoras; de outro, os gestos dos responsáveis pelas crianças, integrados às brincadeiras, constantemente direcionados ao prazer de satisfazer e provocar risos e risadas nos pequenos. Pouco a pouco, criou-se uma atmosfera de carinho e cooperação mútua em que os responsáveis se relacionaram entre si e com os bebês, de modo a tornar as brincadeiras e investigações em momentos lúdicos e, por que não dizer, mágicos.

Nesse processo de pesquisa e prática continuada, percebemos que o corpo de cada bebê transita de acordo com o do seu responsável, a partir de vínculos que permitem intensas trocas de experiências e afetos. O processo de emancipação é mútuo: bebê e responsável, gradativamente, entendem os próprios limites ao mesmo tempo em que expandem suas fronteiras. Nossa atividade, portanto, busca reafirmar a instituição cultural e também o espaço expositivo como territórios comuns a todos. Espaços que convocam o bebê como um sujeito filosófico que interage e interfere no espaço, assim como nas imagens e nas relações que ali se estabelecem.

Como receber um bebê filosófico e autônomo?

Devido à grande quantidade de público interessado em participar nas edições anteriores, a atividade “Ai Weiwei para Bebês” teve inscrições prévias que contemplavam crianças e seus responsáveis. A organicidade do espaço onde ocorreu o encontro começou a ser pensada desde o momento de chegada e recepção, entendendo ser fundamental que crianças e responsáveis estivessem tranquilos para o início da atividade com os educadores. Isso também perpassa aspectos fundamentais de um olhar pedagógico e mediador diante das ações, incluindo áreas para a troca de fraldas, a organização dos carrinhos e ainda a higienização prévia do espaço, possibilitando conforto e liberdade para todos os que transitaram no espaço.

A atividade foi realizada às dez da manhã de quinta feira, e propusemos que a vivência tivesse uma hora de duração. Após o acolhimento das famílias, momento no qual apresentamos a proposta do encontro e a pesquisa do GT Infâncias, realizamos a separação de dois grupos: bebês que andam e bebês que ainda não andam. Essa divisão se relaciona aos diferentes momentos do desenvolvimento cognitivo que cada criança apresenta, considerando que o processo de exploração de ambientes varia de acordo com a autonomia motora que a criança exerce sobre o próprio corpo.

Enquanto o grupo dos bebês que andam estava indo para a galeria se aproximar das obras de Ai Weiwei, o grupo dos bebês que não andam foi direcionado para o “laboratório”, uma sala onde estavam dispostos, junto ao cenário que criamos, alguns objetos relacionais pensados a partir de obras, cores e narrativas presentes na exposição. Depois de meia hora, os grupos trocaram de espaço.

O espaço do laboratório foi adaptado para a atividade, na intenção de tornar o ambiente acolhedor e seguro, assim como estimular vivências sensoriais e facilitar a interação entre as crianças e seus responsáveis. Em cada uma de nossas atividades para bebês – e nessa não foi diferente – percebemos nitidamente que o espaço pode estimular diferentes tipo de relações entre os participantes.

Explorar o desconhecido

Em “Ai Weiwei para bebês”, a amplidão do espaço expositivo promoveu ainda momentos de experimentação sonora. Usando apenas um tubo amarelo sanfonado, comumente encontrado em canteiros de construção civil, a imaginação de muitos pequenos foi ativada. O pequeno Arthur, por exemplo, criou variados sons na companhia de sua mãe: com um simples conduíte nas mãos, ele balbuciava e soltava pequenos gritos toda vez que um novo som saía do objeto. A educadora Mariana Morais mostrou-lhe, então, como fazer som de passarinho com o conduíte. Pelo sorriso, Arthur deve ter achado um barato. E a mãe de Arthur pareceu gostar da ideia de um brinquedo tão simples e tão prazeroso de brincar.

Apesar de partir de objetos bastante simples, a complexidade da atividade se revelou com os múltiplos caminhos de investigação possíveis para tornar os mesmos objetos instigantes aos participantes, ao ponto de todos se sentirem tocados e impulsionados a encontrar e explorar tais elementos. Foi emocionante acompanhar a realização desse processo, assim como perceber o quanto as trocas e relações se intercruzaram no decorrer na atividade: cada qual com seu par, aumentando por vezes para trio, quarteto e assim por diante. Houve, inclusive, um momento em que todos se envolveram juntos na brincadeira com os objetos, assim como outros instantes em que cada criança foi para um canto do espaço brincar com seu acompanhante. Dentre as diversas situações vividas, um grande feito foi a intensidade palpável da atividade, percebida por todos que intensificaram as próprias presenças ao experimentar aquele encontro.

Música, choro, barulho, gritinhos, risadinhas, rostos zangados e também tristeza pelo fim da atividade: tudo aconteceu conforme os corpos das crianças correspondem e devem fazer. O contínuo desenvolvimento das relações de cada criança com os espaços visitados – o laboratório e a galeria de exposições – tornou-se mais visível a cada instante de admiração pelos objetos, pelas salas com suas portas gigantes, pelo barulho do ar condicionado e até mesmo pelas demais pessoas desconhecidas que estavam também a circular pelos mesmos espaços. A cada instante, diferentes percepções e sensações eram traduzidas pela espontaneidade dos pequenos corpos-sujeitos que, naquela tarde, exploravam o centro cultural, cheios de surpreendentes inteirezas e curiosidades despertas. O impacto desses pequenos corpos é ainda impressionante pela inquietude que tendem a despertar nos adultos, ao mesmo tempo estimulados e desafiados pela curiosidade dos pequenos.

Seja para corpos já maduros ou ainda em desenvolvimento primário, a experiência do sensível tem na investigação do espaço uma das mais importantes fontes, de modo que estar no espaço da galeria deve ser um direito também garantido às crianças pequenas e seus acompanhantes.